Tá Todo Mundo Tentando: reclamar

Eu reclamo, tu reclamas, ele reclama, nós reclamamos.

Para ouvir lendo → "the slab", do disco desse ano do Slowdive, “everything is alive”. Falo um tantinho mais de shoegaze lá no final do email.

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por Tiago ElCerdo Lacerda

Reclamar

Eu reclamo, tu reclamas, ele reclama, nós reclamamos e etc. Não significa que podemos consertar. Ou que queremos concerto.

Muitas das coisas das quais reclamamos são inconcertáveis. Mas reclamamos porque é o que dá pra fazer, o que tem pra hoje, o que tá mais fácil. Na reclamação, buscamos identificação. Assim como dor de amor, certo descontentamento real ou inventado, é universal. Todo mundo reclama, com ou sem razão. Você também.

Já tentou passar um dia sem reclamar? Eu já, e te conto: é bem mais difícil que passar um dia inteiro sem mentir — o que também já tentei e não é nada fácil. Inclusive, mente quem diz "eu não reclamo".

A beleza da reclamação, do protesto, da queixa, da reclamação como passatempo, do desabafo casual ou da reclamação furiosamente adequada, é que cabe em quase qualquer lugar. Fila de cartório, caixa de comentários, mesa de bar, fim de festa, viagem de carro ou conversa de travesseiro. Sempre há espaço pra uma reclamadinha.

Reclamar, inclusive, estreia laços. Dizem que é o desdém pelas coisas, mais do que o amor por algo, que une as pessoas — algo que só quem já fez aliança na escola ou no trabalho menos por afinidade e mais por ranço comum vai entender.

O x da questão (x sendo o nome atualizado daquele rede social para reclamações, da qual amamos reclamar) é que existe uma linha quase invisível que separa o reclamar charmoso, espirituoso e às vezes até divertido da reclamação insuportável, egocêntrica e viciada. Que às vezes até é uma reclamação justa, digna e cheia de razão, mas que exige tanta energia de quem reclama e de quem ouve que acaba se esgotando em si mesma antes de se transformar em alguma ação que resolva o motivo da queixa.

Ninguém aguenta quem só reclama. E quem só reclama normalmente não se aguenta também. Daí acaba isolado, de outrem e de si mesmo, preso na rodinha da reclamação incessante. É cansativo, além de chato pacas, e faz mal pra saúde do corpo e do espírito.