🏋🏼 Tá Todo Mundo Tentando: ir pra academia
Tentando ficar inteira quando o corpo anda insistindo em se bagunçar.
Oi,
Essa é mais uma edição da Tá Todo Mundo Tentando, e hoje estamos:
Sem paywall,
Escrevendo sobre maromba (academia, exercício, qualquer tipo de rotina de exercício físico), tema de um newsletteraço com as colegas, com mais links no final da edição.
Vamos ver o que a IA de imagem do Substack me entrega sobre isso:
Não me convenceu. Daqui pra frente o conteúdo é todo humano - como você poderá confirmar pelo uso selvagem de vírgulas e pelo ocasional hífen no lugar de travessão.
Tem dias em que penso que uma das coisas mais radicais que uma mulher da minha geração pode fazer é ir para academia e não postar nada.
Aliás, ir pra academia sem celular, com o plano de treino num papel. Só uma toalha, uma garrafa de água e um sonho. Sem check-in, sem look, sem legenda tipo “hoje foi difícil, mas fui”.
Tenho quase 50 anos e passei boa parte da minha vida gastando o corpo como se não houvesse amanhã. Você sabe: sono sem regras, bebida, comida, cigarro. Outras coisas mais. Juro que teve uma época em que me convenci que dançar (num club, numa rave) equivalia a fazer algo tipo corrida. E na época talvez fizesse sentido. Acredito que a juventude é para ser aproveitada, sim, porque seu corpo tem uma capacidade mágica de recuperação e os vinte anos são os anos para tomar más decisões porque ainda há tempo de consertá-las. Há tipo de imunidade temporária, um passe livre para viver no modo “depois eu vejo”.
Depois veio o depois. Veio a maternidade, os horários, as responsabilidades, a falta de tempo, de dinheiro, de energia. Depois, ainda, veio a consciência de que o corpo, além de ser corpo, é sempre lido, avaliado, comparado, discutido. O que antes era charme vira descuido, e essa mudança acontece rapidinho, enquanto você está ocupada com a vida que não para de acontecer. Pior se você for mulher. Como quase tudo. A gravidez é um dos processos mais malucos, intensos e transformadores que um corpo pode aguentar e que lindo é ser mãe - mas póbi de você quando assumir que tem um corpo de pessoa que já pariu.
E esse é só o começo do problema.
Exceto caso você consiga combinar que não é um problema. Combinar com você mesma, claro, porque com o mundo esse combinado não existe. O corpo valorizado é o corpo que acolhe as expectativas alheias. Um corpo que não existe. O que não diminui a necessidade de continuar tentando chegar nele.
Tem pelo menos uns dez anos que venho tenho tentado outra relação com o (meu) corpo. Um tipo de trégua de uma briga que começou na época em que fui trabalhar na frente de câmeras e tive que ouvir que tinha celulite demais para usar minissaia. Eu achava que era uma pessoa bem padrão, até descobrir que não era padrão o suficiente. E nunca seria. Meu tempo nem tinha começado direito e já tinha passado. Mas se pelo menos eu me cuidasse um pouquinho…
Chamo de trégua, e não de mudança porque seria mentira dizer que cheguei num equilíbrio. Às vezes consigo manter uma rotina que me faz feliz, mas às vezes o mundo desaba e eu desisto. Tudo depende de tempo, de dinheiro, de disposição, de humor, de sorte. O corpo é o primeiro a sentir quando a vida pesa. E a vida depois dos 45 tem tendência a pesar cada vez mais.
Me irrita essa cultura do “corpo como projeto”. Como se fosse possível gerenciar a própria existência fazendo planilha no Notion: treino, proteína, terapia, gratidão, sono, repetir. Há quem faça, mas é um discurso de bem-estar para privilegiados que virou a nova religião, tendo o espelho como altar. Não é meu lugar, nunca foi, não será. Não acredito em vida otimizada, nem em wellness editado, um tipo de espetáculo de pureza que promete controle num mundo descontrolado, cobrando caro por isso. Não tem tempo, grana, paciência? Ué, e a meritocracia, como fica? Quem quer faz, quem não quer dá desculpa?
Penso nisso quando vejo o termo messy girl pipocar nas redes. A garota bagunçada, natural e espontânea cuidadosamente produzido é a carinha dos nossos tempos tortos, uma resposta estética à clean girl de anteontem, um desleixo que dá trabalho, que tem liberdade de ser imperfeita, mas só se for bonita. E jovem. E magra. E rica.
Me dá uma preguiça enorme porque, honestamente, nem quero ser girl. Já fui. Sou mulher e a bagunça que me habita é real. É a bagunça de um corpo que tenta, que falha, que cansa, que pensa e se mexe porque precisa. E que vem entendendo que não precisa caber em nada - beleza do envelhecimento, porque aquilo que a vida tira do colágeno ela pode te dar em segurança, se você deixar.
A
escreveu há não muito tempo aqui no Substack que as pessoas mais cool do momento são as mulheres 50+. Justamente as que não estão tentando parecer nada, estão ocupadas sendo muito confortáveis em peles que conhecem muito bem. Segurança é cool. É o melhor aspecto da GenX: um desinteresse genuíno pela pose. O anti-look como forma de existir - so cool!E o corpo também é messy. Errático, intermitente, contraditório. Tem dia que ele levanta, tem dia que não. Tem fase que a endorfina vem, e fase que não vem nada. Nesse vaivém, me reconheço: minha motivação depende do humor, de uma gripe, dos freelas, da vida, do universo e tudo o mais.
Cada vez que eu tento “melhorar” o corpo, descubro que o que quero, na real, é habitá-lo: encontrar conforto no movimento. Quando me mexo, sinto que funciona. Que é isso. O sangue circulando desliga a cabeça e o corpo volta a ser só corpo. Tem algo meio espiritual em se desconectar do olhar — inclusive do próprio. Nenhum espelho, só o som do fôlego compassado.
O que venho aprendendo nos meus anos de tentativa é que fazer exercício não é sobre transformar o corpo, mas sobre fazer as pazes com ele. O mais bonito não é o resultado. É o simples fato de ter ido. Tentando ficar inteira quando o corpo anda insistindo em se bagunçar.
Meu corpo já foi campo de batalha, mas nunca foi projeto. Hoje menos ainda. Minha cabeça, sim. É um arquivo. Lá na frente, quando a inevitável ruína se impor, terei as marcas das festas, amores, parto, insônias, domingos preguiçosos, livros, filmes, músicas, ressacas, almoços. Momentos ótimos, momentos péssimos. Quem tem idade, tem história - ou espera ter.
💌 Giro de newsletter
Nessa semana, as colegas do meu grupo de whatsapp favorito combinaram de explorar o tema esforço físico em suas newsletters. Vou colando aqui conforme as publicações saírem:
A
escreveu sobre suas aventuras no mundo da corrida - e, confie, não vai tentar te convencer a entrar para essa seita, pode ler tranquila:
Já a
, na sua , partiu do livro Esforços Olímpicos, da taiwanesa Alenise Chen (saiu em português pela Todavia) para falar sobre água como espaço de cura:
3. A
escreveu sobre sua história com a yoga, prática que leva pra onde for:A
escreveu sobre a ideia de mente sã/copo são e deu esse título lindo: o corpo que aprende.
🔔 Veja também: Guia Paulicéia
🚨 Guia Paulicéia: 11 coisas para fazer em São Paulo
Oi, Essa é mais uma edição do Guia Paulicéia, o compilado de coisas legais para ver/fazer em São Paulo enviado semanalmente para apoiadores da Tá Todo Mundo Tentando.
Tá Todo Mundo Tentando: malhar
Para ler ouvindo → “Start to Move”, do Wire. É curtinha, então pode ouvir duas vezes. Não sei que tipo de música você ouve para fazer exercício, mas confia em mim: punk rock é melhor. Bom dia.
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Bom fim-de-semana!
Como sempre, para falar comigo é só me responder esse email ou deixar um comentário:













"Cada vez que eu tento “melhorar” o corpo, descubro que o que quero, na real, é habitá-lo: encontrar conforto no movimento."
me senti tão abraçada por essa frase <3
Muito bom! Encontrar conforto e familiaridade no exercicio é o exercicio constante. Encontrei espaços e incentivos que me ajudam a buscar o corpo e a saúde que quero. Adorei ver sua percepção. Inclusive essa academia que você postou viralizou no xuitter essa semana ahahah