De volta
Essa é o 44ª texto da Tá Todo Mundo Tentando, após um hiato breve em que enviei textos repetidos porque chegou muita gente nova por aqui - no momento em que escrevo já passamos dos quatro mil cento e tantos assinantes, com uma taxa de abertura que nunca fica abaixo dos 40%. Como você (espero) deve ter notado, começamos essa nova fase com duas novidades: a versão em áudio, da editora de podcasts Jessica Correa, e a nova versão da nossa icônica ~tentander, agora pelo traço da ilustradora-talentosa-minha-amiga-pessoal (no, really) Adriana Marto. Obrigada por ler, sharing is caring e até sexta que vem 🗣️
🎧 Para ouvir lendo: Ben Harper, Walk Away (Tidal/Youtube)
Um dos muitos efeitos da pandemia foi o fim do “tudo bem?”. Pelo menos na minha bolha, claro, não tô dizendo que todo mundo deixou de usar o “tudo bem, e você?“. Mas por aqui esse “tudo” já estava deslocado há tempos, mesmo antes de março de 2020, e nosso trauma coletivo escancarou que não, bicho, não tá tudo bem, por favor não me pergunte o porquê. Todo mundo que não está comendo capim sabe que não está tudo bem e que o ponteiro tem apontado bem mais para o muito-ruim do que para o até-que-bom.
O que não significa que não se possa ser feliz de alguma forma. Temos nossas esferas pessoais onde é plenamente possível ser feliz enquanto o mundo desmorona. Pelo menos um pouco. Inclusive, se é o seu caso, por favor seja feliz, assim você vai acabar fazendo algumas pessoas felizes também. Tenho uma amiga que está num começo de relação, toda apaixonada, com olhos brilhando quando fala de seu novo objeto do afeto — e quem sou eu, do alto da minha miséria emocional, pra dizer que “o mundo está acabando, queridinha, por favor não me incomode com sua felicidade”?
Tem que ter espaço, sim, para conquistas individuais. E, principalmente, espaço para o amor. Sempre há. Sem isso, o que sobra?
Há umas semanas um amigo pegou minhas mãos e falou: até quando você vai ficar fingindo que está tudo bem? Não era muito óbvio o assunto em questão e eu fiquei uns dias pensando tudo bem o quê? tudo bem onde? e esperando o universo jogar na minha cara o que quer que fosse que não está lá muito bem mesmo e que precisa de luz para mudar. Acontece que odeio conflito. Principalmente os de tipo terreno, aqueles em que se faz necessário parar e olhar as coisas como são, sem cores bonitas, para então tomar decisões com base no que está acontecendo aqui e agora. Esse aqui e agora é o que a gente tem, não é? Com base em que mais é possível fazer planos, criar expectativas, ter esperança? O passado em que respondíamos “tudo bem, e você” não existe mais, se tornou uma coisa distante para a qual olhamos com saudades. Esse passado não volta.
E o futuro, bom o futuro a gente precisa criar, mesmo quando tudo ao nosso redor pareça indicar que ele não existe. Mais do que a ansiedade ou a depressão química, talvez o que defina nosso tempo (em especial os últimos dois anos, em especial os últimos três meses) seja uma brutal falta de esperança. Você tem esperança? De onde tira? Do que se alimenta? E como faz pra ter também?
📚 #Chegouaqui
Importante: a TTMT pode ganhar uma pequena porcentagem da venda caso a compra seja efetuada através desses links. Os livros também estão disponíveis em formato Kindle.
Uma pediatra que não tem paciência com crianças, menos ainda com mães e pais delas, e (pecado ainda maior) FUMA! A partir dessa premissa, a personagem vai se vendo envolvida por personagens e ambientes que detesta ou despreza, o que dá margem para situações e diálogos que ficam ali entre o engraçado e o cruel.
Um dia essa noite acaba - Roberto Elisabetzki
A São Paulo dos anos 1980 e o movimento pelas eleições diretas são cenários para um drama familiar, em que uma visita inesperada joga luz em acontecimentos marcantes. À venda no site da editora Boitempo.
Oito Contos Enjaulados - Anderson Estevan
Seleção de oito contos do escritor e poeta. A chave aqui é a solidão, que o autor destila através de paisagens e personagens, às vezes fantásticos, sempre surpreendentes. À venda no site da editora.
👓 Estou lendo
Esses dias a Juliana Cunha lançou no Twitter uma thread/pensata sobre o significado do fim do RSS para pessoas que leem e escrevem. Depois, aprofundou as ideias em uma edição da sua ótima Já Matei Por Menos. Isso é uma coisa que todos nós deveríamos fazer muito mais em matéria de redes sociais: não entender um punhado de tweets como um fim, mas como um meio (às vezes não é nem isso).
Ainda nessa temática de brevidade vs profundidade, a Barbara Bom Ângelo escreveu bonito em sua Queria Ser Grande Mas Desisti sobre como falar de livros na internet. Se de um lado temos booktoks urgentes mostrando o que é possível mostrar em vídeos de segundos, por outro nós (ainda) temos gente escrevendo longos reviews com emoção e a partir de experiências pessoais. Cabe tudo na internet. Mas cada vez mais se faz necessário perguntar: o que você *quer* consumir?
Não sei vocês, mas eu sinto falta de ter blogs para ler. O Substack supre um pouco essa carência, porque muitas das newsletters que sigo têm essa característica de um conteúdo que é pessoal mas que não vem com aqueles maneirismos de creator/influencer. É mais um escape de quem escreve e que acompanhamos por nos identificarmos com os interesses, referências e opiniões do outro. Não é uma questão de plataforma, e sim de tipo de conteúdo. Tanto que quando penso em organizar meu cantinho online não penso em um blog per se, mas em um “lugar” em que tudo que crio/acompanho possa não só encontrar sua audiência (assunto pra outro dia: a gente precisa mesmo dessa loucura por aumentar audiência? o quanto de audiência é suficiente?) mas principalmente ver essas criações e interesses crescerem.
O que me leva a esse texto sobre “jardins digitais”. O nome talvez pese um pouco na poesia, mas o conceito é ótimo.
🎙️ Estou ouvindo
“Ah, não! Fechou?” da produtora SonoraBox, da Thais Lancman e Thaís Aleixo, é um podcast sobre lugares de São Paulo que não existem mais. Tem o Genésio, o Exquisito e o quarto episódio é sobre a Peixaria Mitsugi, que animou algumas noites ali por 2018.
Eu participo rapidinho dando uns pitacos e lendo essa crônica do passado que começa falando “no bingo hipster de 2017 você deve ter marcado o neon da Peixaria Mitsugi” — frase que não é minha, só roubei de alguém.
Tá todo mundo tentando: fingir que está tudo bem